BOAS VINDAS

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sexta-feira, 31 de agosto de 2012

O outro marido



O outro marido



Era conferente da Alfândega – mas isso não tem importância. Somos todos alguma coisa fora de nós; o eu irredutível nada tem a ver com as classificações profissionais. Pouco importa que nos avaliem pela casca. Por dentro, sentia-se diferente, capaz de mudar sempre, enquanto a situação exterior e familiar não mudava. Nisso está o espinho do homem: ele muda, os outros não percebem.
Sua mulher não tinha percebido. Era a mesma de há 23 anos, quando se casaram (quanto ao íntimo, é claro). Por falta de filhos, os dois viveram demasiado perto um do outro, sem derivativo. Tão perto que se desconheciam mutuamente, como um objeto desconhece outro, na mesma prateleira de armário. Santos doía-se de ser um objeto aos olhos de Dona Laurinha. Se ela também era um objeto aos olhos dele? Sim, mas com a diferença de que Dona Laurinha não procurava fugir a essa simplificação, nem reparava; era de fato, objeto. Ele, Santos, sentia-se vivo e desagradado.
Ao aparecerem nele as primeiras dores, Dona Laurinha penalizou-se, mas esse interesse não beneficiou as relações do casal. Santos parecia comprazer-se em estar doente. Não propriamente em queixar-se, mas em alegar que ia mal. A doença era para ele ocupação, emprego suplementar. O médico da Alfândega dissera-lhe que certas formas reumáticas levam anos para ser dominadas, exigem adaptação e disciplina. Santos começou a cuidar do corpo como de uma planta delicada. E mostrou a Dona Laurinha a nevoenta radiografia da coluna vertebral com certo orgulho de estar assim tão afetado.
– Quando você ficar bom...
– Não vou ficar. Tenho doença para o resto da vida.
Para Dona Laurinha, a melhor maneira de curar-se é tomar remédio e entregar o caso à alma de Padre Eustáquio, que vela por nós. Começou a fatigar-se com a importância que o reumatismo assumira na vida do marido. E não se amolou muito quando ele anunciou que ia internar-se no hospital Gaffré e Guinle.
– Você não sentirá falta de nada – assegurou-lhe Santos. – Tirei licença com ordenado integral.
Eu mesmo virei aqui todo começo de mês trazer o dinheiro. Hospital não é prisão.
– Vou visitar você todo domingo, quer?
– É melhor não ir. Eu descanso, você descansa, cada qual no seu canto.
Ela também achou melhor, e nunca foi lá. Pontualmente, Santos trazia-lhe o dinheiro da despesa, ficaram até um pouco amigos nessa breve conversa a longos intervalos. Ele chegava e saía curvado, sob a garra do reumatismo que nem melhorava nem matava. A visita não era de todo desagradável, desde que a doença deixara de ser assunto. Ela notou como a vida de hospital pode ser distraída: os internados sabem de tudo cá de fora.
– Pelo rádio – explicou Santos.
Um dia, ela se sentiu tão nova, apesar do tempo e das separações fundamentais, que imaginou uma alteração: por que ele não ficava até o dia seguinte, só essa vez?
– É tarde – respondeu Santos. E ela não entendeu se ele se referia à hora ou a toda a vida passada sem compreensão. É certo que vagamente o compreendia agora, e recebia dele mais que a mesada: uma hora de companhia por mês. Santos veio um ano, dois, cinco. Certo dia não veio. Dona Laurinha preocupou-se. Não só lhe faziam falta os cruzeiros; ele também fazia. Tomou o ônibus, foi ao hospital pela primeira vez, em alvoroço. Lá ele não era conhecido. Na Alfândega informaram-lhe que Santos falecera havia quinze dias, a senhora quer o endereço da viúva?
– Sou eu a viúva – disse Dona Laurinha, espantada.
O informante olhou-a com incredulidade. Conhecia muito bem a viúva do Santos, Dona Crisália, fizera bons piqueniques com o casal na Ilha do Governador. Santos fora seu parceiro de bilhar e de pescaria. Grande praça. Ele era padrinho do filho mais velho de Santos. Deixara três órfãos, coitado. E tirou da carteira uma foto, um grupo de praia. Lá estavam Santos, muito lépido, sorrindo, a outra mulher, os três garotos. Não havia dúvida: era ele mesmo, seu marido. Contudo, a outra realidade de Santos era tão destacada da sua, que o tornava outro homem, completamente desconhecido, irreconhecível.
– Desculpe, foi engano. A pessoa a que me refiro não é esta – disse Dona Laurinha, despedindo- se.

(Carlos Drummond de Andrade)


quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Alimentos que curam



Alimentos que curam


Embrapa tem realizado pesquisas com hortaliças para conter diabetes, hipertensão e câncer.

Fonte: O Liberal, de 27/8/2012 - 12:41 - Saúde


Abóbora contra a diabetes, pitanga roxa para combater o câncer, alface enriquecida com ácido fólico e alho para reduzir o colesterol. Isso sem contar a melancia, que começa a ser estudada, pois há evidências de que tem substâncias úteis contra a hipertensão arterial. Toda esta safra de novos alimentos está em desenvolvimento em diversos segmentos da Embrapa e pode chegar à mesa do consumidor nos próximos anos. Ao natural ou em cápsulas.

— Depois de confirmar que a abóbora gila, produzida no Sul do país (e com gosto de melancia), contém substâncias que reduzem o açúcar no sangue, quantificamos as sulfonilureias (compostos que promovem a liberação de insulina e são utilizados em medicamentos para diabetes tipo 2) e produzimos uma barra de cereal, mas as substâncias se perderam. Fizemos então comprimidos com a mesma dosagem usada em medicamentos alopáticos — explica o pesquisador Celso Moretti, chefe-geral da Embrapa Hortaliças, cujo estudo contou com a parceria de alunos de Farmácia e Nutrição da UnB e financiamento do CNPq.
Os remédios contra a diabetes que estão no mercado têm exatamente a mesma molécula encontrada na abóbora, a glibenclamida, que quando ingerida, estimula o pâncreas a secretar insulina no organismo. Por ser natural, a cápsula de abóbora passou por um comitê de ética da UnB e, há uma semana, teve início um ensaio-piloto com 24 pessoas, entre saudáveis e pré-diabéticas, que serão divididas em dois grupos: um vai tomar o placebo, o outro as cápsulas de abóbora durante quatro meses. Até novembro, um segundo ensaio será feito com 80 pessoas. Se tudo der certo, o fitoterápico será patenteado, negociado com um laboratório e lançado no mercado.

— Isto nunca aconteceu com medicamentos, é um desafio grande e temos que trabalhar com rigor científico para assegurar a qualidade. Os médicos envolvidos calculam que a dosagem dos seis comprimidos diários de abóbora chega a 15mg da substância, enquanto que a necessidade diária para diabéticos fica entre 4mg e 23 mg diários. Resta saber como a glicose do grupo testado se comportará nesses quatro meses — diz Moretti.
Depois da abóbora gila, ele começa a testar os hipotensivos de duas qualidades de melancia, a de mesa e a forrageira, usada para alimentação de animais. E aí começa uma nova pesquisa para tentar combater a hipertensão arterial.

Alface com 15 vezes mais ácido fólico

Outra aposta, dessa vez da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, está no cultivo de uma alface crespa transgênica, que recebeu dois genes de uma planta-modelo (a Arabidopsis thaliana, primeira a ter o genoma completamente sequenciado) e, com isso, ficou enriquecida com 15 vezes mais ácido fólico, quantidade de vitamina equivalente à do espinafre europeu, que tem o maior teor já visto e é encontrado no Sul do Brasil — o mais comumente consumido por aqui é o da Nova Zelândia. O melhor é que apenas 20g da folha (duas alfaces pequenas) já têm 70% das 400 mcg diárias recomendada para adultos (grávidas têm recomendação de 600mcg a 800 mcg), sem alteração de aspecto ou sabor.
— As propriedades não se perdem depois que a alface é colhida e já observamos que, no mercado, sob luz florescente, podem até aumentar — comemora o pesquisador Francisco Aragão, responsável pelo laboratório de transferência de genes da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia.

Dieta feminina inspirou pesquisa

A pesquisa começou sob a inspiração da preocupação das mulheres com a balança. Desde 1994, há uma lei no Brasil que obriga a suplementação de farinha com ácido fólico, mas boa parte da vitamina é perdida no preparo de pães e bolos e muitas mulheres não comem esses produtos com medo de engordar. Com a alface é o oposto: a folha quase não tem calorias e é a mais consumida de toda as hortaliças no país.
— Já fizemos ensaios preliminares com coelhos e o ácido fólico no sangue dobrou em uma semana, voltando ao normal com o fim da suplementação. A partir de agora a planta passa por comitês de biossegurança para depois ser cultivada e melhorada. Nossa expectativa é dobrar esse teor nas folhas — acredita Aragão.

A força natural das pitangas

Em Pelotas, no Sul do Brasil, a Embrapa Clima Temperado desenvolve desde 2006 um projeto que usa pitangas roxa, vermelha e laranja no combate às células de câncer. Tudo começou com a visita do médico americano Michael Wargovich, que não conhecia a fruta rica em antocianinas, carotenoides e fenóis (que funcionam como anti-inflamatório nas células) e passou a estudá-la em parceria com a Faculdade de Farmácia e Bioquímica da UFRS e a Universidade da Carolina do Sul, nos EUA, onde ele conduz a parte avançada da pesquisa. No Brasil, são feitos os extratos das plantas, que depois são enviados para os EUA.
— Na pesquisa em laboratório os extratos reduziram as células cancerígenas, mas os resultados posteriores foram confusos e, por isso, os testes estão sendo repetidos — conta a pesquisadora Márcia Vizzoto, do setor de fruticultura, que também desenvolve projetos com amora e mirtilo.
A ideia é que os extratos de frutas vermelhas reduzam tumores em ratos geneticamente modificados para desenvolver formas humanas de tumores. Se tudo der certo, a pesquisa deve recomendar o consumo de pitangas como parte do tratamento contra o câncer.


Fonte: O Globo


segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Nu


          Nu


Quando estás vestida,
Ninguém imagina
Os mundos que escondes
Sob as tuas roupas.

(Assim, quando é dia,
Não temos noção
Dos astros que luzem
No profundo céu.

Mas a noite é nua,
E, nua na noite,
Palpitam teus mundos
E os mundos da noite.

Brilham teus joelhos,
Brilha o teu umbigo,
Brilha toda a tua
Lira abdominal.

Teus exíguos
- Como na rijeza
Do tronco robusto
Dois frutos pequenos -

Brilham.) Ah, teus seios!
Teus duros mamilos!
Teu dorso! Teus flancos!
Ah, tuas espáduas!

Se nua, teus olhos
Ficam nus também:
Teu olhar, mais longe,
Mais lento, mais líquido.

Então, dentro deles,
Boio, nado, salto
Baixo num mergulho
Perpendicular.

Baixo até o mais fundo
De teu ser, lá onde
Me sorri tu'alma
Nua, nua, nua...

Manuel Bandeira



sábado, 25 de agosto de 2012

Síndrome da Gabriela


Síndrome da Gabriela



      Deixar de aceitar mudanças no seu estilo de trabalho pode causar problemas no futuro. Um problema cada vez mais comum no ambiente profissional é a inflexibilidade, conhecida como "Síndrome da Gabriela".
      Ao menos, esta é a análise do presidente do CFA (Conselho Federal de Administração), Sebastião Luiz de Mello, tomando como base o trecho da música cantada por Gal Costa: “Eu nasci assim, eu cresci assim, e sou mesmo assim, vou ser sempre assim... Gabriela… sempre Gabriela”.
      “O mercado de trabalho está cheio de profissionais com a síndrome. São aquelas pessoas que, mesmo qualificadas tecnicamente, se recusam a mudar por acreditarem que as coisas devem ser feitas do seu jeito”, diz Mello.
      As consequências de tal comportamento, explica o especialista, é o não crescimento na carreira e, no caso de líderes, uma performance menor da equipe.
      “Quem tem esse comportamento prejudica não só a si mesmo, mas toda a empresa. Afinal de contas, não é possível crescer e alcançar metas realizando procedimentos que já não são satisfatórios (…) Com esse discurso, muitos profissionais com potencial ficam estacionados no tempo”, ressalta o presidente do CFA.
      Como reconhecer?
      Algumas frases são típicas de profissionais inflexíveis. As mais famosas, segundo Mello, são as seguintes: “vamos fazer assim, pois sempre fizemos desta maneira”; “Sei que isto é bom, mas prefiro fazer do meu jeito”; “Eu sinto muito, mas sou assim”.
      Dentre os motivos que fazem com que estes profissionais se comportem de tal maneira, o especialista acredita que o medo de não dar certo, de errar ou de receber críticas se destacam. Para quem sofre da apelidada “síndrome da Gabriela” o caminho, sugere Mello, é repensar as atitudes e começar a mudar de postura.
     “O processo de mudança nem sempre é fácil: exige trabalho, planejamento e força de vontade. Por isso, muitos preferem continuar fazendo as mesmas coisas no trabalho e na vida pessoal, perdendo a oportunidade de conhecer novos caminhos, amadurecer e descobrir novas possibilidades”.

http://br.financas.yahoo.com/noticias/s%C3%ADndrome-gabriela-
profissionais-devem-ter-185600865.html. Acessado em 07/07/12)