BOAS VINDAS

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sábado, 21 de julho de 2012

Fila nos bancos


Fila nos bancos

Crônica

O cliente engravatado sorriu e entregou à simpática caixa do banco um cartão, escrito à máquina: "Vá enchendo a maleta. Comporte-se com naturalidade. Estou segurando uma arma. Obrigado".
Não frequento agências bancárias, serviço assumido por minha mulher. Perder nas filas tempo que emprego escrevendo resultaria em prejuízo financeiro. No geral a consorte volta exausta e indignada com alguma coisa. A espera, que às vezes começa a quilômetros do guichê, sempre a expõe a alguma convivência desagradável. A impaciência, o lento passo a passo suscitam intimidades. A maioria força o diálogo oferecendo balas, caramelos e biscoitos. "Experimente, são deliciosos." Por educação ela aceitou uma dessas delícias: sofreu na fila mesmo uma cólica violenta, não suporta nada que tenha coco. Uma vovó levava no colo uma criança que amou minha mulher à primeira vista e quis mudar de peito. "Segure ela um pouquinho, gostou da senhora." Embora não houvesse reciprocidade, minha cara-metade foi gentil. Aconteceu exatamente o que vocês estão adivinhando. Ou sentindo o odor.
Mas eu contava a história do ladrão de banco.
A caixa nem olhou para os lados para que o assaltante não pensasse que pedia socorro. Diante dela, o falso cliente mantinha o mesmo sorriso imóvel. A maleta preta já estava aberta sobre o guichê. Hesitou. Então ele parou de sorrir e mexeu o braço armado. Ela depositou o primeiro maço de notas de dez na maleta.
Em época de eleições não é seguro revelar o nome de seu candidato nas filas, diz-me minha mulher. Já vi gente se sair mal por isso. Brigar é uma forma de preencher o tempo. Ela se queixa em especial dos portadores de mau hálito, justamente os chegados às confidências cara a cara. Companheiro de fila para alguns é como padre em confessionário. Mas há coisas piores. Uma tarde minha mulher voltou da agência possessa. Um cavalheiro atrás dela, fumando um charuto, perguntou-lhe: "Não está sentindo um cheiro de queimado"? Distraidamente ele fizera um furo em seu vestido. Sabem quanto me custou a distração?
Além das confissões constrangedoras, também há aquelas correntistas que pedem conselhos - não sobre aplicações. Depois da narração de uma história trágica, perguntam ansiosamente como se a uma velha amiga: "Em meu lugar o que a senhora faria? Devo fazer isto ou aquilo? Devo permitir que minha filha saia com ele?". Outro dia minha mulher chegou em casa trêmula. Uma mãe desesperada, da qual nem lembrava, acercara-se dela, ameaçadoramente, no banco: "Fiz o que aconselhou e sabe qual foi o resultado? Minha filhinha há três meses desapareceu com o cafajeste..."
Mas eu contava a história do ladrão de banco.
A caixa foi colocando os maços de dinheiro dentro da maleta preta. Lentamente, o que irritava o assaltante. Atrás dele a fila crescia. E a fila ao lado também. O assalto praticado por um homem só porém prosseguia, a cada segundo mais tenso em meio ao movimento da agência, protegida por guardas fardados.
O mais chato são certos encontros garantiu minha mulher. ­ Gente que não vemos há décadas e das quais nem lembramos mais.
Como a saudade atua nos músculos! Ela mostrou-me o vestido amassado. Uma vizinha de infância, pesando uns 80 quilos, quase a matara comprimindo-a entre os braços. Isso enquanto lambuzava-lhe o rosto com beijos prolongados. Até seus cabelos ficaram em estado lamentável. Despregou-se um botão. Nada mais inconveniente que topar com antigos conhecidos em hora errada!
Mas eu contava a história do ladrão de banco.
Subitamente um cavalheiro aproximou-se do assaltante com um palmo de sorriso. Colocou-se entre ele e a moça.
Batista, você! Há quanto tempo! Ainda esta semana conversei com seu tio no supermercado! Me dê um abraço, amigão! Mas, o que é isso? Vai sair por aí com esse baú cheio de dinheiro? Não tem medo de ladrões, não?
Batista olhou para o chão mas não viu buraco algum para esconder-se.
A caixa, sorrindo, ao amigo dele:
Seu Batista não vai sair com esse dinheiro, não; ele veio depositar...


REY, Marcos

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