BOAS VINDAS

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terça-feira, 13 de março de 2012

Viagem a Paris


       Viagem a Paris

─ Ouvi dizer que vai a Paris.
─ Exato.
─ A negócio?
─ Não.
─ Turista?
─ Não.
─ Missão política reservada?
─ Não.
─ Tão secreta assim?
─ Não.
─ Se não sou indiscreto...transa de amor?
─ Não.
─ Está muito misterioso.
─ Não.
─ Como não? Saúde, talvez.
─ Não.
─ Compreendo que não queira alarmar...
─ Não.
─ Busca apenas repouso.
─ Não
─ Fugir do trabalho, então.
─ Não.
─ Capricho do momento.
─ Não.
─ Tantos não devem significar um sim.
─ Não.
─ Significam sim. Vou repetir as hipóteses.
─ Não.
─ Temos pela frente uma indústria nova, de vulto.
─ Não.
─ De qualquer maneira, é financiamento internacional.
─ Não.
─ Então a coisa está ficando preta.
─ Não.
─ Está preta, e há jogadas que só em Paris.
─ Não.
─ Percebe-se alguma coisa no ar.
─ Não.
─ Não dá para perceber, mas há.
─ Não.
─ Mas pode haver a qualquer momento.
─ Não.
─ Nem hipótese?
─ Não.
─ Nenhuma nuvem distante, muito distante mesmo?
─ Não.
─ No ano que vem?
─ Não.
─ Ouvi mal?
─ Não.
─ Sendo assim, é segredo pessoal?
─ Não.
─ O coração é quem dita a viagem... eu sei.
─ Não.
─ Sim, sim. Pode confessar.
─ Não.
─ Hoje em dia essas coisas são públicas. Dão até cartaz.
─ Não.
─ Sei que não precisa disso, mas...
─ Não.
─ Por que não? Está com medo da imprensa?
─ Não.
─ Receia perder a situação social?
─ Não.
─ situação financeira?
─ Não.
─ Política?
─ Não
─ Pois olhe, melhor é preparar o ambiente.
─ Não.
─ Claro que sim. Insinuar mudança em sua vida.
─ Não.
─ Discretamente.
─ Não.
─ De leve, só uma pincelada. Deixe comigo.
─ Não.
─ Não abro manchete nem boto aquela foto em duas colunas,    aquela bacana, lembra?
─ Não.
─ Só cinco linhas.
─ Não.
─ Duas.
─ Não.
─ Mas tenho de dizer alguma coisa.
─ Não.
─ O senhor é notícia.
─ Não.
─ Pode dizer que não, mas é sim.
─ Não.
─ Puxa vida, o senhor hoje está medonho. Resolveu responder não a tudo que é pergunta minha?
─ Não.
─ Ah, é? Então vamos recomeçar: o senhor vai a Paris?
─ Vou.
─ E que é que vai fazer em Paris?
─ Ver.
─ Ver o quê?
─ O Último Tango em Paris.
─ E por que é que não me disse isso logo, homem de Deus?
─ Você não me perguntou, por que eu havia de responder?

(Carlos Drummond de Andrade)

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