(Des)acordo
ortográfico: o Brasil piscou, e agora?
A Academia Brasileira de Letras divulgou na
quarta-feira uma nota oficial em que lamenta o “retrocesso” do adiamento para
2016 da obrigatoriedade da vigência do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa
no país. Afirma que estava pronta para dar início a uma campanha internacional
destinada a tornar o português – enfim uma língua única – um dos idiomas
oficiais de trabalho da Organização das Nações Unidas (ONU).
Compreende-se a frustração. Decidido por decreto assinado
pela presidente Dilma Rousseff no apagar das luzes do ano passado, dias antes
do fim do prazo de adaptação previsto anteriormente, o adiamento é um estranho
caso de tiro desferido no próprio pé pela diplomacia brasileira.
Esta vinha exercendo um papel consistente de
liderança no trabalho de unificar uma língua de 260 milhões de falantes que,
mesmo sendo uma só (variações nacionais e regionais são, mais que inevitáveis,
bem-vindas), nunca soube se pôr de acordo sobre algo banal como a forma de grafar
suas palavras. Internacionalmente, isso não é só um fator de confusão e
constrangimento. É sinal de fraqueza. Se um aborígine australiano do último
cafundó de Queensland escreve inglês com a mesma grafia de um nova-iorquino,
qual é o sentido de nativos de Rio e Lisboa, cidades irmãs, divergirem em seu
português?
O trabalho foi difícil, lento, realizado sobre o
solo pantanoso de orgulhos e desconfianças ancestrais – para não mencionar a má
vontade natural da maioria do público com a ideia de virem esses sabichões
mexer no que funciona. O texto do acordo data de 1990, mas só em 2008 foi
aprovado pelo Parlamento português.
Sempre considerei o conteúdo do acordo
decepcionante sob diversos aspectos. No entanto – fora arroubos de anarquismo
que são tentadores para qualquer escritor, raça pouco afeita à deglutição de
regras sobre seu instrumento de trabalho – nunca deixei de entender o argumento
político de sua validade. Tentando me conformar com as absurdas regras do hífen
e com palavras grotescas como “corréu”, eu pensava: foi o acordo possível,
paciência. Negociações são assim, perde-se aqui para ganhar ali, vamos em
frente. E parecia que íamos mesmo. Agora ninguém sabe se iremos.
O adiamento assinado pela presidente veio,
estranhamente, num momento em que o trecho mais incerto e turbulento da jornada
já tinha ficado para trás. A custosa adoção do acordo ia adiantada no Brasil,
muito à frente dos demais países lusófonos. Pode-se mesmo dizer que era
completa: sistema de ensino, imprensa e editoras, hoje todo mundo segue em
nosso país a nova ortografia.
Em Portugal, onde o marco inicial da
obrigatoriedade já estava fixado em 2016, as resistências eram e são bem
maiores. Compreensível. A cultura portuguesa é informada por um sentimento de
posse sobre a língua, o que alimenta mágoas diante da liderança brasileira no
processo. O fato é que tudo ia caminhando, trancos e barrancos incluídos. O
Brasil tinha se tornado um farol na epopeia da unificação.
Agora o farol fraqueja e ameaça se apagar. Os
adversários ativos do acordo – mais fortes fora do país, mas nada desprezíveis
aqui dentro – podem soltar fogos, espalhar temores sobre o risco imaginário que
ele oferece à “diversidade cultural” e protocolar os pedidos de vista do
processo e demais recursos protelatórios que têm na manga. E a provável maioria
silenciosa que sempre encarou com antipatia a decisão de mexer na língua talvez
diga, concordando com aquele meu lado anarquista: “Bem feito”.
O decreto de Dilma tornou bastante concreta a
possibilidade de que os setores público e privado do Brasil tenham investido
uma fortuna para, em nome da unificação, implementar uma reforma ortográfica
que jamais terá validade fora de nossas fronteiras.
Fonte: Veja online
Autor: colunista Sérgio
Rodrigues
O AO em Portugal vai bem, muito obrigado.
ResponderExcluirDê uma olhada:
http://emportuguezgrande.blogspot.pt/p/evolucao-da-aplicacao-do-ao-em-portugal.html
Não percebo porque vc não publica este comentário.
ResponderExcluirComo aqui deixei antes, a aplicação do AO em Portugal vai bem, obrigado, como se pode ver aqui:
http://emportuguezgrande.blogspot.pt/p/evolucao-da-aplicacao-do-ao-em-portugal.html
Não tinha publicado seu comentário antes por não tê-lo percebido, desculpe a demora em fazê-lo. Fi-lo agora, pois tenho imenso interesse nessa questão do Acordo Ortográfico entre as nações lusófonas.
ExcluirInclusive, gostaria de discutir um pouco essa questão com vc. Se quiser, procure-me numa dessas redes sociais: Twitter.com/@pimentel_belem, Facebook.com/Pimentel Gonçalves, Google+/Pimentel Gonçalves.