O otimista
O
Pessimista não conseguia fazer o Otimista se desesperar. Uma vez tinham tido
uma conversa seriíssima sobre a condição humana, com o Pessimista tentando
convencer o Otimista de que a existência era uma coisa absurda.
—
Nós não somos nada. Somos seres insignificantes, num planeta sem importância,
num Universo sem sentido!
—
Certo — concordara o Otimista. — Mas fora isso...
Outra
vez o Pessimista declarara que nada valia a pena porque em alguns bilhões de
anos o Sol se expandiria e todo o sistema solar, inclusive a Terra, seria pulverizado.
Ao que o Otimista retrucara:
—
Você, então, não recomenda investir em imóveis?
Nem
a situação do Brasil preocupava muito o Otimista.
—
Sabe como é que nós vamos acabar? — disse, uma vez, o Pessimista. — Comendo
rato. Caçando rato pra botar na mesa.
—
Como? — perguntou o Otimista, interessado.
—
Assado!
O
Otimista ponderou esta informação. Depois quis saber:
—
Com quê?
Não
é que fosse um simples. É que sempre via o outro lado da questão. Gostava de
dizer coisas como "tudo se arranjará" e "quando é noite aqui, é
porque é dia em outro lugar". Era a sua maneira de ser prático e manter a
boa disposição. Usava muito frases que começavam com "Por outro
lado...".
—
Nós não vamos desta para melhor — lamentava-se o Pessimista. — Não existe outra
vida depois desta. É terrível.
—
Por outro lado... — observava o Otimista — nós não precisamos nos preocupar com
a transferência do domicílio eleitoral...
Certa
vez, no bar onde se encontravam para o chope diário, o Pessimista começou a
falar na possibilidade de uma guerra nuclear.
—
Você aí, com essa cara alegre, e nós podemos muito bem estar a poucos minutos
de uma guerra atômica.
—
Será?
—
Sabe quanto tempo levaria para o mundo inteiro ser destruído numa guerra
nuclear? Meia hora.
O
Otimista chamou o garçom e pediu:
—
Outro chope.
—
Meia hora, nada. Quinze minutos! — corrigiu-se o Pessimista.
O
Otimista chamou o garçom de volta.
—
Traz logo dois. E bota na conta.
Um
dia o Pessimista entrou no bar agitadíssimo, entre apavorado e eufórico. Suas
piores previsões tinham se confirmado.
—
É ele!
—
O quê?
—O
Apocalipse!
—
Você está brincando.
—
Venham ver. A terra está se abrindo em fendas. Chove enxofre. É o fim dos tempos!
—
Por outro lado... — começou o Otimista.
—
Desta vez não tem outro lado! — berrou o Pessimista. — É o fim mesmo.
Saíram
à rua e, de fato, era o fim. Tudo ruía. Labaredas subiam de rachaduras no chão.
As pessoas corriam sem rumo, em pânico, ou então se ajoelhavam e pediam
clemência a Deus. E no céu, por entre nuvens grossas e negras, surgiram os
quatro cavaleiros do Apocalipse montando seus terríveis animais.
—
Está vendo? — gritou o Pessimista para o Otimista, triunfante. — São os quatro
cavaleiros do Apocalipse. O que é que você me diz agora?
O
Otimista estava estudando atentamente os quatro cavalos que galopavam nas
nuvens em direção à Terra conflagrada. Finalmente, tomou a decisão:
—
Aposto na Peste e dou a tropa!
Luís Fernando Veríssimo
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