A vida é um sonho
Era a terceira noite depois de dois sonhos
idênticos e me apavorava a ideia de uma terceira vez. Minhas pálpebras já
pesavam. Tomei um banho frio, bebi uma xícara de café. Não adiantou. Sentei no
sofá da sala, crente da minha derrota para Morpheus e rememorarei os sonhos
anteriores. Sem eu perceber o sono me venceu.
De repente, escureceu rápido.
Em volta, muitas árvores, e a lua enorme no céu. Um velhote de chapéu veio em
minha direção e, dentro do sonho, recordei: era figura dos sonhos de antes.
- Vou repetir para nunca
mais.
Falou com voz doce de avô e
sumiu. Acordei em um pulo só. Anotei tudo e decidido: seguiria o conselho do
homem do sonho. De manhã, pus o necessário na mochila e parti.
Seis horas de ônibus até a
cruz depois do terceiro trevo, como proferiu o velhinho. De longe, vi a cruz
fincada. O condutor parou metros depois dela e voltei andando. Avistei também
uma mercearia. Fui até lá.
A vendeira ofereceu galinha
de quintal. Foi o melhor guisado já provado por mim. Ao terminar, perguntei
quanto era. Nada, meu filho, respondeu.
- Só tome cuidado. Sei do que
falo. Se precisar reze, peça ajuda a nossa senhora.
Devolvi com um riso amarelo e
sai apressado. Voltei até a cruz e entrei no mato. Rasgue a mata até achar o
caminho, sempre em linha reta, o velho dizia dentro da minha cabeça.
Dei um golpe de facão potente
nos cipós e avistei um riozinho raso. Do outro lado dele, uma picada, o tal
caminho. Ao fim da picada, a árvore amarela, estava escrito.
Segui. O sol baixara e,
depois de muito andar, avistei a imensa e linda árvore. A copa reluzente no
lusco-fusco do fim do dia. Abracei-a como a uma irmã. Esperei a noite cair para
procurar a caixa de metal, como indicado. Sentei no chão e fechei os olhos.
Quando abri, tudo era um breu intransponível.
Liguei a lanterna para a
busca. Achei fácil. Abri e li o recado dentro: “cave. Não olhe para trás até o
sol chegar”. Comecei a tarefa com meu facão e os bichos berraram para me
expulsar da mata. Roguei a nossa senhora e continuei até atingir no vaso de
cerâmica, mencionado no sonho.
Tirei a tampa e quase cego
com tanto brilho: moedas, barras até uma coroa de ouro. Riqueza sem precedentes
para um pobre coitado como eu. “È a herança. Pode levar”, a voz do velho
sussurrou às minhas costas.
Assustado, virei. Ninguém. Ao
olhar de volta, o brilho sumiu. Foquei com a lanterna e vi os vermes no lugar
do tesouro incalculável. “Não olhe para trás”. Desobedeci.
Voltei para estrada por
debaixo de uma chuva que surgiu do nada. Andei até amanhecer. No despontar da
aurora vermelha, me convenci que a vida é sonho.
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